Compra de votos começa inflacionada na Baixada

Em Magé o preço varia entre cestas básicas, bombas d’água e promessa de R$ 100 no dia da eleição. Em Japeri aceita-se um par de dentaduras, mas uma laqueadura de trompas – mesma moeda usada nos bairros carentes de Belford Roxo e Queimados – pode servir também para fechar o negócio

 

Eleições novas, práticas antigas. A campanha eleitoral está só começando e a maioria dos candidatos ainda nem botou o bloco na rua, estando apenas no ensaio, mas nos bairros periféricos de municípios como Magé, Duque de Caxias, São João de Meriti, Belford Roxo, Nova Iguaçu, Queimados e Japeri, nos recantos onde acontecem coisas que até Deus duvida, o velho esquema da “captação ilícita de sufrágio”, a popular compra de votos, está correndo solta e os agentes compradores fazem qualquer negócio para garantir um mandato eletivo para o “patrão” ou um fantoche deste. Alguns deles já foram condenados por essas e outras práticas, estando inclusive impedidos de disputar cargos eletivos, mas sempre há um parente com ficha novinha em folha disposto a correr o risco e aí o ilegal caminha de mãos dadas com a necessidade pelas ruas dos bairros pobres, com grande oferta e gente disposta a pagar por ela.

Numa comunidade carente de Mauá, em Magé, por exemplo, moradores de 44 modestas unidades habitacionais, já garantiram que vão votar num candidato local e noutro de fora indicados pelos agentes compradores. Em troca vão ter uma bomba d’água e uma improvisada rede de distribuição, benefícios garantidos pela generosidade tão comum em Magé e nas cidades vizinhas em época de eleição. Além desse e outros “benefícios”, cabos eleitorais tem distribuído, às escuras, em Suruí, cestas básicas, alimento que faz muita diferença para quem tem de se desdobrar para alimentar a filharada. Nessa hora ninguém quer saber se o candidato tem ficha limpa e pouco importa a ficha podre dos que, porventura, estiverem por trás dele…

Não muito distante de Mauá e Suruí, na localidades de Parque Estrela e Vila Recreio, a oferta até supera a procura. Por lá quem dá as cartas é um político sem mandato, que agora faz a vez de cabo eleitoral de quem melhor estaria lhe pagando, um de fora que jura que é local desde pequenino. Isso se repete nos bairros Jardim Anhangá, Morabi e Parque Paulista, já no município de Duque de Caxias, onde o mesmo candidato esbanja generosidade e preocupação com os mais carentes, bondade levada através de assessores regiamente pagos, sempre em espécie, com um dinheiro que dificilmente aparecerá na prestação de contas a ser enviada à Justiça.

Nos arredores do Lote 15, de Duque de Caxias a Belford Roxo, a Estrada Joaquim da Costa Lima é o acesso mais fácil a bairros insalubres, com ruas esburacadas e banhadas pelo esgoto in natura que escoa a céu aberto. Nessas comunidades títulos são recolhidos diariamente para que os eleitores possam ser cadastrados no esquema mais manjado, a chamada “boca de urna”, com os votantes regimentados para “trabalhar” em favor de determinado candidato no dia da eleição. O trabalho, entretanto, é o de votar no dito cujo, em troca de míseros R$ 50. 

Na cidade mais pobre da região os leitores, mais pobres ainda, são tratados como os votantes das cidades pequenas do Nordeste. Para as mulheres cirurgias de laqueadura de trompas e para os homens, se lhes faltam dentes, um par de dentaduras, mas uma caixa de cervejas para o fim de semana também serve. Essa é realidade de Japeri, que apresenta um dos piores índices de desenvolvimento humano e tem milhares de pessoas vivendo abaixo da linha de pobreza.

“As práticas são as mesmas e os agentes fiscalizadores sabem muito bem disso. Os compradores são velhos conhecidos da Justiça, mas comprovar o ato de compra de votos não é assim tão fácil. Muitos dos envolvidos nesse esquema nem candidatos podem ser, mas escolhem alguém para apoiar e é aí que mora o perigo, pois estão afim de eleger um que vai lhes arrendar o mandato. Uma campanha de esclarecimento não funciona nesses casos. Quem tem fome tem pressa, dizia o o sociólogo Betinho e o perigo está exatamente nisso aí, pois a miséria é mesmo aliada dos maus políticos”, pontua a socióloga Mirtes Cerqueira.

 

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Comentários:

    1. Comungo da sua opinião Suely. Não podemos generalizar e nem criticar a quem vende o voto.

      Temos que criticar a quem compra o voto. Estes sim são os canalhas da história.

  1. Voto a R$ 50, quem vai? Só falta uma banquinha de camelô nas esquinas da Baixada. Parabéns, Elizeu, por retratar a verdade. Aqui em Japeri deveríamos trocar o lugar do município para VERGONHA.

  2. Campanha eleitoral é conscientização de idéias e projetos em torno de um candidato.Essa antiga prática, graças ao Ministério Público, aliado á fiscalização eleitoral, está se tornando obsoleta e também descaracterizando candidaturas sem respaldo moral de um representante do povo.Muito oportuna a nota publicada.

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