Professor da rede de ensino de Belford Roxo estudou na EJA e hoje aponta o caminho para o futuro
Agosto de 2021. Após a pandemia, Israel Silva, 40 anos, entra na sala de aula da Escola Municipal Casemiro Meirelles, no bairro Vale do Ipê, em Belford Roxo. Um filme passa em sua cabeça. É que há 23 anos ele estava estudando na Escola Municipal Jorge Ayres de Lima, no Parque São José, para tentar finalizar o seu último ciclo da Educação de Jovens e Adultos (EJA), antigo supletivo. Duas décadas se passaram e Israel concluiu o ciclo, cursou o ensino médio, fez a graduação de história e voltou à sala de aula. Desta vez, como professor contratado da Secretaria Municipal de Educação. A EJA de Belford Roxo tem cerca de três mil alunos matriculados em 21 unidades.
Ainda garoto, Israel Silva se deparou com a realidade de muitos meninos pobres: ter que começar a trabalhar cedo. Ele começou em uma fábrica de pipas e depois atacou de vendedor de guaraná natural e outros produtos, além de office-boy. Mas a vontade de estudar e cursar uma faculdade estava viva. Em 1999, Israel se matriculou na EJA da Jorge Ayres de Lima. Ele havia parado na antiga sétima série (atual oitavo ano). Mas Israel teve que se alistar e acabou prestando o serviço militar no Exército, tendo que interromper os estudos. Quando saiu do quartel, retornou para concluir o ensino fundamental através da EJA, em 2002. “Via a dificuldade de vizinhos que trabalhavam e só podiam estudar à noite. Minha tia Marta Jordão me incentivou muito. Os professores da EJA também me ajudaram”, concluiu Israel, que fez o ensino médio no Ciep Clementina de Jesus, no bairro Pantanal, em Duque de Caxias.
Caminho longo – Mas o caminho para se tornar professor de história era longo e duro. Depois de fazer um curso e trabalhar também como garçom, Israel conseguiu depois vaga em uma empresa no bairro Caju. Focado em cursar história, ele foi surpreendido com o pedido da empresa para que estudasse logística, pois, caso contrário seria demitido. Estudou apenas um período. “Fui à faculdade e disse que ia trocar de curso, pois minha paixão é história. Pedi que Deus me desse direção para que tudo saísse da melhor forma”, conta Israel, sem conseguir segurar as lágrimas. “Durante o curso eu não tinha noção de como fazer o TCC (Trabalho de Conclusão de Curso), mas consegui concluir e fui aprovado.”, resumiu.
O secretário municipal de Educação, Denis Macedo, enfatizou que a conquista de Israel serve de exemplo para os alunos da EJA, pois podem vislumbrar um mundo diferente concluindo os estudos. “A Secretaria dá todo apoio necessário para que os professores desenvolvam o trabalho. Ficamos felizes em saber que um ex-aluno da EJA hoje é professor de história da rede municipal. Ele provou que sonha é possível e, estudando, a tendência é que os caminhos se abram”, encerrou Denis Macedo.
Exemplo para alunos – Já formado, Israel estagiou no Colégio-Escola Jardim Cristina (Cejac), no Parque São José. Meses depois, estava empregado na instituição, pois duas professoras precisaram se afastar e ele assumiu turmas. A rotina era pesada, pois também trabalhava em outra empresa à noite. Em 2021, Israel participou do processo seletivo da Prefeitura de Belford Roxo e foi contratado como professor de história, carreira que ele tanto desejou.
“Assinei o contrato e pedi demissão da empresa. Eu largava lá de manhã e corria para dar aula na escola particular. Depois do contrato, senti-me totalmente realizado, pois estava na carreira que sempre almejei. Minha esposa (Flávia Tavares da Silva) e minha filha Rhayssa me dão muita força. A diretora da Casemiro Meirelles (Sirlene Nascimento Silva) e todo o pessoal me acolheram muito bem”, finalizou Israel, que já está na segunda graduação (artes) e é pós-graduado em historiografia brasileira.
Procurando sempre ajudar os alunos, Israel lembra que já passou noites e noites acordado para estudar e não deixar o seu sonho virar pesadelo. O professor em muitos momentos atua para não deixar que os alunos desanimem. “Sei das dificuldades, mas digo sempre que eles podem chegar aos objetivos. Só depende deles para que a vida mude. O esforço vale a pena. Muitas pessoas tentaram me desanimar quando eu estava estudando. Diziam que professor não ganha bem e que eu ia reclamar. Mas eu não dei bola e busquei forças”, frisou.
Israel não esquece do apoio que recebeu de diversas pessoas e do corpo docente da Escola Municipal Jorge Ayres de Lima. “Nessa minha luta, os professores da EJA foram fundamentais, pois ajudam os alunos no que tiver ao alcance. O que faz o sucesso de um homem não é o dinheiro: é o que ele conquista. E eu sou feliz com o que conquistei”, concluiu Israel, com a voz embargada, recebendo o carinho dos alunos. “Era um aluno educado que gostava de conversar com os professores. Falávamos sobre vários assuntos da época. Sinto muito orgulho por ele ter conquistado o que tanto almejou. É um vencedor”, frisou Juberlan Garcia Silva, 55 anos, 30 de magistério, que deu aula de Ciências para Israel na EJA.
A chefe de Divisão de Educação de Jovens e Adultos, Thatiana Barbosa, também não conteve a emoção ao conhecer o professor na sala de aula. “É gratificante ver um ex-aluno da EJA se formar e dar aula na rede municipal. Israel tem muito amor pela Educação e serve de exemplo para outros alunos que querem conquistar algo na vida”, destacou Thatiana, com os olhos marejados. “É um professor apaixonado pelo o que faz”, emendou a diretora do Casemiro Meirelles, Sirlene Nascimento da Silva.