STJ decide que guardas municipais não podem agir como policiais, devendo se limitar à proteção do patrimônio público municipal

● Elizeu Pires

Em Jundiai a Prefeitura armou sua guarda com carabinas – Foto: Divulgação

Que a Constituição não atribui às guardas municipais atividades ostensivas típicas de agentes policiais (civis ou militares) todos sabem, menos os comandantes dessas corporações, que insistem em sair fazendo blitz e abordagens por aí, se distanciando da finalidade para qual as GMs foram criadas: a proteção do patrimônio dos municípios.

Para acabar com o que vem sendo visto como usurpação pelas GMs das funções policiais, o  Superior Tribunal de Justiça (STJ) deixou claro, com decisão da 3ª Seção, de que as guardas desempenham atividade de segurança pública, mas com “o dever de proteger os bens, serviços e instalações municipais, bem como seus respectivos usuários”, mas não podem atuar como “polícia de verdade”, como tem acontecido em muitas cidades, onde guardas municipais tem se envolvido até em investigações, como se tivessem autoridade para isso.

Interpretação conveniente – De acordo com o STJ, os guardas municipais só podem fazer buscas pessoais e abordar pessoas, quando a ação estiver diretamente relacionada à finalidade da corporação. Os comandantes das GMs vêm interpretando à suma maneira o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), que diz que essas corporações integram sim a segurança pública, mas em nenhum momento conferiu a elas atividades inerentes as das polícias militar e civil,

A 3ª Seção do STJ seguiu entendimento do ministro Rogerio Schietti Cruz, relator do processo, que ao apresentar seu voto destacou o que vem sendo ignorado nos municípios onde os GMs querem atuar como se policiais realmente fossem: “as polícias civil e militar, estão sobre o controle externo do Ministério Público e do Poder Judiciário”, ao contrário das guardas municipais.

Entende o ministro, que se as guardas municipais fossem “verdadeiras polícias”, também deveriam estar sujeitas a esse controle. “Não é preciso ser dotado de grandes criatividades para imaginar, em um país, com suas conhecidas mazelas estruturais e culturais, entre as quais o racismo, o potencial caótico de autorizar que cada um de seus 5.570 municípios tenha sua própria polícia subordinada apenas ao prefeito local e insubmissa a qualquer controle correcional externo”, diz um trecho do texto do relator.

Nada de investigar – A decisão do STJ está sendo vista como conflitante ao entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que as GMs exercem atividade de segurança pública, mas o ministro responde em seu voto que isso não significa que os guardas municipais tenham a amplitude de atuação das polícias. “O STF, apesar de reconhecer em diversos julgados que as guardas municipais integram o sistema de segurança publica e exercem atividade dessa natureza, nunca as equiparou por completo aos órgãos policiais para todos os fins. A 1ª turma do STF também asseverou que as guardas municipais não estão autorizadas a, ultrapassando os limites próprios de uma prisão em flagrante, realizar diligências investigativas ou prévias voltadas a apuração de crimes.”

O ministro cita ainda que “é possível e recomendável” que as GMs “exerçam a vigilância de creches, escolas, postos de saúde municipais, para garantir que não tenham sua estrutura danificada por vândalos, ou que seus frequentadores que não sejam vítimas de furto, roubo, tráfico ou violência, a fim de permitir, portanto, a continuidade da prestação do serviço público municipal com relato a tais instalações”, e que os guardas podem realizar patrulhamento preventivo na cidade, mas dentro da finalidade de proteger bens, serviços e instalações municipais”.

“Não é das guardas municipais, mas sim das polícias, como regra, a competência para investigar, abordar e revistar indivíduo suspeito da prática de tráfico de drogas ou de outros delitos cuja prática não atinja de maneira clara, direta e imediata os bens, serviços e instalações municipais ou as pessoas que os estejam usando naquele momento”, concluiu a decisão.

Armas pesadas – O desvirtuamento é tão grande em alguns municípios que em setembro de 2020 a Prefeitura de Jundiaí, no estado de São Paulo, começou a equipar sua Guarda Municipal com armamento pesado, adquirindo, inicialmente, 18 carabinas e cinco mil munições. As armas foram adquiridas com recursos do programa de Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa), do governo federal.

“São armamentos fáceis de manusear e bastante leves, utilizados pelas principais forças policiais do Brasil. Com eles, nossos guardas municipais estão melhor equipados para trabalhar no policiamento da cidade”, disse à época o então titular da Unidade de Gestão de Segurança Municipal de Jundiaí, Paulo Sérgio de Lemos Giacomelli, que antes havia equipado a GM 14 armas de calibre 12.

Sem armas Rio – No Rio os esforços para armar a Guarda Municipal tem enfrentado dificuldades e a própria população reprova. Em abril deste ano, por exemplo, o Órgão Especial do Tribunal de Justiça julgou constitucional um dispositivo da Lei Orgânica do Município que veda o uso de armas de fogo por parte da corporação.

A distribuição de armas para a GM carioca foi proposta por um membro licenciado da corporação, que quando vereador havia apresentado um  projeto de emenda à Lei Orgânica do Rio para derrubar a proibição.

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