Caxias lidera o ranking de violência doméstica no início do ano, apontam dados do Tribunal de Justiça

Nos anos 70 e 80 o município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, era apontado com o mais violento da região, com uma média de três homicídios por dia, a maioria atribuída aos grupos de extermínio. Agora os números da violência voltam a ser destaque na cidade, não em mortes naturais, mas em agressões em família. De acordo com dados divulgados pela Assessoria de Imprensa do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Caxias está em primeiro lugar no ranking da violência doméstica: 1.073 casos em janeiro. O segundo maior número foi registrado na Região da Leopoldina, na Capital, com 936. Depois vem Nova Iguaçu (664 casos), São Gonçalo (620), Jacarepaguá (603), Bangu (526), Barra da Tijuca (500) e Campo Grande (com 454 registros).

De acordo com os números do TJ, o crime de lesão corporal apareceu como o mais recorrente em 2018, com 50.052 casos, seguido de ameaça, caracterizada como violência psicológica (27.739), e injúria, definida juridicamente como violência moral (8.515 casos). A violência doméstica engloba ainda a violência patrimonial, que envolve violação de domicílio, dano e supressão de documentos; e a sexual, como os casos de estupro. O Judiciário fluminense encerrou o ano de 2018 com 135.216 ações de violência doméstica em seu acervo.

Segundo o juiz Antonio Alves Cardoso Junior, titular do 1º Juizado de Violência Doméstica e Familiar de Duque de Caxias, o fato de o município ser o quarto mais populoso do estado e possuir diversos bolsões de pobreza contribuem para esse alto índice. “Embora a violência doméstica exista em todas as classes sociais, nas mais altas, muitas vezes por vergonha, o registro deixa de ser feito pela vítima”, explicou.

O magistrado destaca outro fator que vem contribuindo para o encorajamento das denúncias, a Patrulha da Maria da Penha, nome dado ao convênio feito entre aquele Juízo e o município de Duque de Caxias em que os casos mais graves são encaminhados para acompanhamento. A equipe da Patrulha é formada por guardas municipais que atuam 24h por dia, divididos em turnos, que fazem visitas periódicas à casa da vítima, a acompanham em audiência e verificam o cumprimento de medidas protetivas. As participantes são selecionadas de acordo com o risco enfrentado.

Tendo atuado por 11 anos em varas Criminais e Tribunais do Júri, o juiz Antonio Alves Cardoso Junior está, desde 2011, à frente do Juizado de Violência Doméstica. Ele lembra um caso que o marcou, o de um homem que agrediu a esposa e as filhas em uma feira. “Durante a instrução, resolvi ouvir as filhas, embora não tivessem sido arroladas pelas partes para depor. Elas contaram as surras que levavam desde que eram pequenas, sendo que o pai batia tanto nas filhas quanto na mãe, além de terem sido vítimas de outras agressões em público. Ainda assim, as filhas, já duas moças sendo uma delas casada, choravam muito no depoimento. Estavam nitidamente com pena do pai”, contou.

Para o magistrado, muitas vezes é difícil identificar o início de uma relação de violência doméstica, pois há muitas variações comportamentais. “Há casos em que nunca houve nem mesmo agressão verbal. Às vezes, a mulher é violentamente espancada, ou mesmo morta, por um motivo banal, mas, em grande parte das vezes, a violência começa com agressões verbais e ameaças até descambar para a violência física”.

Às mulheres que hoje vivem em situação de violência doméstica, o magistrado faz um alerta. “Devem denunciar, ou seja, efetuar o registro de ocorrência ao menor sinal de violência, seja ela física ou moral, pois a experiência mostra que, normalmente, o agressor é encorajado pela inércia da vítima e costuma ir aumentando o grau de violência. Mas, quando a mulher efetua o registro da primeira violência, normalmente, o homem fica intimidado”.

O juiz Octávio Chagas de Araújo Teixeira, titular do Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher da Comarca de Nova Iguaçu e Mesquita, orienta as mulheres em situação de violência doméstica a procurarem os serviços disponíveis em sua região para obter informações sobre as providências que podem ser tomadas. “Sem prejuízo, devem comparecer à Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) e efetuar o registro de ocorrência para terem a proteção necessária. Além disso, devem buscar sua rede de apoio, familiares, amigos, pessoas próximas que poderão dar o suporte para conseguir romper com a relação violenta”, diz.

Otávio Chagas foi o terceiro magistrado que mais recebeu novas demandas de violência doméstica em janeiro de 2019, com 664 novos casos, e o segundo com maior média de processos (921) distribuídos em 2018. O juiz lembra um caso emblemático que julgou. Uma mulher foi torturada com o uso de faca, alicate e machadinha pelo ex-companheiro na frente dos três filhos do casal. Dizendo que ela pagaria por tudo o que tinha feito durante o relacionamento, ele ameaçou cortar suas pernas com um machado. A vítima teve as costas e o pé esfaqueados e seus dedos de uma das mãos torcidos, quebrados e, depois, decepados. O agressor foi condenado a 18 anos de prisão pelos crimes de tortura, constrangimento ilegal, cárcere privado, posse e porte irregular de arma.

O Juiz Auxiliar da Presidência do TJRJ Leandro Loyola de Abreu pede que as vítimas denunciem o agressor para que o estado possa reduzir essa triste estatística. “A vítima, muitas vezes, deixa de fazer a denúncia por vergonha. Quem tem que se envergonhar é o agressor! O registro deve ser feito e a família e os amigos devem apoiar a pessoa agredida somando forças à estrutura oferecida pelo estrado para coibir esse tipo de crime”.

(Com a Assessoria de Imprensa do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro)

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