Ministério Público Federal quer a participação de pescadores em reparações ambientais no aterro do Jardim Gramacho

Celebrado pelo Instituto Estadual do Ambiente sem que as comunidades tradicionais de pescadores da região tivessem sido ouvidas, o Termo de Ajustamento de Conduta para recuperação da área do antigo aterro sanitário do bairro Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, poderá ser declarado nulo pela Justiça. Ação pública nesse sentido foi ajuizada pelo Ministério Público Federal (núcleo de São João de Meriti). O MPF quer que o TAC do Inea seja declarado nulo, “em razão da não observância da consulta prévia, livre, formal e informada aos pescadores artesanais que sofrem os impactos do derramamento de chorume no Aterro de Gramacho”.

 O MPF também quer que o Estado do Rio de Janeiro e o Inea sejam impedidos de tomar qualquer decisão administrativa acerca dos danos socioambientais decorrentes da poluição causada no aterro de Gramacho, enquanto não houver a realização da consulta.

Reparação socioambiental – Para adequar as atividades e permitir a obtenção da licença de operação da estação de tratamento de chorume e a licença ambiental de recuperação do antigo aterro controlado de Jardim Gramacho, além de licença de instalação para uma nova lagoa de chorume, o Inea firmou, em novembro de 2017, o TAC n° 07 com as empresas Gas Verde S.A, J Malucelli Construtora de Obras S.A e Biogas Energia Ambiental S.A. Como objeto, em 36 meses, as empresas adotariam medidas ambientais relacionadas as atividades das empresas no aterro metropolitano do Jardim Gramacho, bem como ao pagamento de multas decorrentes de infrações previstas na Lei no 3.467/2000, além da execução de projetos de serviço de interesse ambiental aprovados no Banco de Projetos Ambientais do próprio instituto.

No TAC, estavam previstos três planos de ação. O primeiro tratava diretamente do aterro metropolitano. O outro sobre o apoio financeiro de apoio a sala de situação do sistema de alerta de cheias. Já o último plano de ação remetia a gestão do manguezal de Gramacho.

Apesar de o TAC ter por objetivo a adoção de medidas de recuperação ambiental, o termo foi celebrado, além da falta de consulta prévia, sem conter qualquer previsão específica acerca do enfrentamento dos problemas socioambientais vivenciados pelos pescadores, tampouco houve qualquer participação deles na elaboração de medidas compensatórias.

Recomendação –  Antes de judicializar a questão, o MPF expediu, ano passado, recomendação a Secretaria de Estado do Ambiente e o Inea declarassem a nulidade do TAC. Em resposta, o Inea sustentou a legalidade do acordo, sob a alegação de que houve posicionamento favorável de sua área técnica.

Outro ponto de divergência foi a desconsideração do Inea em relação aos pescadores como povo tradicional. Para o órgão ambiental, o povo tribal seria aquele que se caracteriza como agrupamento humano que não estaria integrado a comunidade nacional. No caso de perda das características tribais, mas sem integração a comunidade nacional, o povo deixaria de ser tribal e passaria a ser tratado como semitribal.

“Não bastasse a visão essencialista e hierarquizante sobre povos tradicionais, o Inea também descarta o cabimento da consulta prévia. Nesse ponto, assevera que a falta de consulta não é capaz de ensejar nulidade do termo. É preciso destacar que os pescadores artesanais da região possuem um vínculo territorial com o lugar, do qual extraem o seu sustento e exercem suas identidades. Não é necessário esperar que estejam em isolamento ou com comportamentos extremamente diferenciados, mas perceber como eles desenvolvem uma atividade própria e se organizam em torno dela, compartilhando os recursos naturais em território de uso temporário e desenvolvendo a identidade enquanto pescadores a partir dessa atividade”, afirma o procurador da República Julio José Araujo Junior, autor da ação civil pública.

Inquérito –  Tramita no MPF um inquérito que apura a lesão a direitos coletivos dos pescadores do Município de Duque de Caxias por omissão do Poder Publico e pela inviabilização de sua atividade de subsistência em razão da poluição causada a Baia de Guanabara, em razão da contaminação do Rio Sarapuí e de manguezais na região de pesca do município de Caxias na Baia de Guanabara.

Existiam mais de 190 pescadores e centenas de famílias que dependiam da pesca, os quais, porém, estavam sendo prejudicados pela atuação do aterro. A instalação de tubulações gigantescas do aterro que o ligavam ao Rio Sarapuí, criando uma vala com dezenas de metros, causou grande prejuízo a pesca. Houve a contaminação de milhares de peixes e caranguejos, ao passo que dezenas de pescadores teriam se adoentado em razão do contato com o chorume e com resíduos, sem nenhum respaldo do Poder Publico.

Apesar de desativado desde 2012, o Aterro Metropolitano de Jardim Gramacho, que já foi o maior “lixão” da América Latina, ainda representa riscos ambientais para a Baía de Guanabara, para o ecossistema dos manguezais e para o Rio Sarapuí. Fissuras e rachaduras em vários trechos do aterro, bem como vazamentos de chorume na Baía, levaram o MPF a ajuizar ação civil pública (processo n° 0001666-93.2012.4.02.5118) para reverter a situação com o monitoramento permanente do lençol freático, do chorume bruto e do tratado.

(Com a Assessoria de Comunicação do Ministério Público Federal)

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